segunda-feira, 21 de julho de 2014

Voltando para casa outra vez...



Retornando ao Brasil logo de cara fui bombardeado por uma série de fatos inusitados. Desde a fuga de Marie algum tempo antes do Rio para São Paulo devido atritos com sua mãe extremamente protecionista que se opunha a ela ir estudar no exterior por ser “apenas a sua garotinha que nada conhece da vida e do mundo”. Além disso, a história sobre a paternidade de Ingrid ainda não estava resolvida e Agatha cada dia mais parecia querer adiar o inadiável sob o pretexto de prepara a filha para a notícia.  Como se isso não envolvesse uma carga emocional de certo já bem pesada como um caminhão de toras num aclive constante esperando o declive para perder os freios devido ao excesso de carga Aline estava grávida e revelar isso para Luíza era inevitável.

Com Marie as coisas se resolveram de forma mais simples. Ela foi morar e estudar em Curitiba com minha mãe e quem sabe a companhia duma mulher mais madura e o fato de ser avó ajudasse a garota. Ademais, ela estaria perto de Ingrid e mesmo sem saber que eram irmãs de sangue a amizade delas serviria tanto para uma como para outra aceitar a notícia que vinha sendo adiada há meses a pedido de Agatha.  Já com Aline as coisas seriam mais complexas. Assim que soube da notícia da gravidez dela tive uma daquelas longas conversas que pessoas adultas devem ter num clima quase sempre estranho e tenso. Aline parecia apenas estar comunicando um fato, como se fosse um memorando da empresa. Disse que iria se mudar de São Paulo e se desligar da empresa durante a gestação e que voltaria no futuro. Apesar de pedir para ela continuar morando em São Paulo ela irredutível partiu para o nordeste e não citou nada de casamento, nem de como a nossa relação seria a partir daquele momento. Disse apenas que o que mais importava naquela hora era nosso filho e ter uma gravidez tranqüila. Sem conseguir convencer ela deixei ela sair pela porta daquele apartamento e partir para o segundo estágio daquele assunto que seria contar sobre a gravidez de Aline para Luíza.

Por uma lado eu esperava que ela perdoasse a traição e que compreendesse alguma coisa sobre a minha natureza diante daqueles fatos, mas assim que ela teve um ataque de raiva achei melhor que o ponto final da nossa relação ficasse naqueles termos por pior que isso pudesse ser. 
Nas semanas seguintes Quim, Marie e Ingrid estariam de férias e todos eles viriam para o Rio ficar comigo por ocasião de negócios a serem resolvidos na cidade e Copa do Mundo. Marie acabou convidando Luíza para passar um final de semana conosco numa casa de praia em Búzios e ela havia aceitado. Parecia que havia um plano de Luíza em voltar atrás e aproveitar o momento para reatar. Entretanto, numa nova conversa com ela, na qual ela se demonstrava mais carente do que desapontada, a conversa toda se tornou numa discussão na qual ela me acusava de ter enganado e estragado com nossa relação. No fundo era verdade, porém ela parecia querer usar algum sentimento de arrependimento da minha parte para poder ter controle da relação e levar um barco avariado para alto mar em meio à tempestade. Mesmo me culpando por tudo esboçava que me perdoaria com o tempo desde que nossa relação resultasse num casamento aos moldes dela. Para mim aquilo seria um martírio dada as proporções que as coisas haviam tomado nas últimas semanas. Pensar em algo assim num momento daqueles era uma loucura e como ela parecia mais destemperada que convicta disso as minhas negativas soaram para ela como mais um ato de terrorismo contra os sentimentos dela. Depois disso ela fez suas malas e partiu no dia seguinte alegando outros compromissos para Marie.

Nesse momento tinha que colocar as coisas comigo mesmo nos eixos. O foco era aguardar alguma novidade de Aline e achar um meio de nos entendermos como antes sem que a posição de um fosse imposta ao outro. Havia ainda toda a história da Ingrid e enquanto não surgia novidades com Aline passei a refletir como resolver o impasse de contar para ela sobre ser o pai dela. Agatha ainda achava que não era a melhor hora, mas dias antes de viajarmos para Búzios o inesperado me levava a crer que adiar mais um dia que fosse era a pior saída. Quim e Ingrid pareciam estar começando um namorico, a proximidade de ambos naqueles dias estava criando um sentimento de afeto entre eles. Seria algo desastroso se os dois depois de começar um romance juvenil descobrissem que são filhos do mesmo pai. Isso foi o fato e argumento que fez Agatha concordar em revelar a verdade imediatamente.

 Numa conversa sem muitos rodeios e de forma bastante simples e direta, eu e Agatha narramos para Ingrid o nosso passado em comum e as razões de ter mantido por tanto tempo isso em segredo. Num primeiro instante a surpresa da notícia, duma verdade intensa posta a mesa deixou Ingrid desolada sem entender muito bem tudo aquilo. Algumas horas depois Marie já sabia do mesmo e Quim também e ficaram cada um ao seu modo perplexos com a novidade. Agatha tentava estar perto da filha e controlar tudo na medida do possível. Com o passar dos dias Ingrid parecia ter assimilado tudo aquilo e não demonstrava sensações de raiva ou revolta com aquilo. Ao que tudo indicava tinha digerido a notícia na medida do possível para uma garota de quinze anos e que sempre esteve duma forma ou outra relacionada com todos os envolvidos nessa história.

Na manhã da final da Copa Ingrid me encontrou na cozinha pro acaso. Eu estava fazendo preparativos para um churrasco. Logo sentamos no quintal e tivemos uma conversa a dois, de pai e filha. Ela disse que sempre gostou de mim e que nunca imaginou que pudesse ser eu o pai dela. Contou que seu pai de criação nunca tinha sido tão chegado dela, e que apesar dos pesares saber da verdade a tinha feito se sentir bem devido o fato de Marie ser sua melhor amiga e agora irmã. Um singelo abraço um pequeno sorriso algumas lágrimas de ambos encerram essa primeira conversa oficial entre pai e filha.

As emoções daquele dia estavam sendo positivas até o a hora do final do jogo. Depois que saímos do Maracanã recebo uma ligação da família de Aline relatando que ela havia perdido o bebê na noite anterior e que estava internada. Aquilo me pegou de surpresa e em cheio como se tivesse levado um golpe de marreta na cabeça. Quando me recuperei do peso inicial da notícia resolvi ir no dia seguinte visitar Aline. Assim que cheguei em Campina Grande conversei com ela já em casa e acamada se desfazendo em prantos pela perda do bebê. O feto não tinha se desenvolvido corretamente nas primeiras semanas e era inevitável um aborto espontâneo. As explicações médicas não me importavam muito, o fato em si era um duro golpe em Aline muito maior que poderia ser em mim e isso me fazia pensar apenas numa forma de ajudá-la. Entretanto, pouco pude fazer. Após esses momentos tristes com Aline o pai dela um velho nordestino desses bem conservadores já me chamou para uma conversa dura e seca e desferiu todas as críticas possíveis sobre a situação me culpando por ter arruinado a vida da tão estimada e única filha como se ela fosse uma garotinha inocente e sem responsabilidade pelos seus atos. Escutei calado ao sermão. Não tinha o que dizer em face ao ódio do pai incompreensivo sobre certas coisas. No dia seguinte parti para Curitiba desta vez. Estava precisando estar num lugar onde ao menos tivesse espaço para me recondicionar para tocar a vida em frente.

Cheguei na hora do almoço e como minha mãe não estava em casa fui visitá-la no colégio. Fazia uns dois meses que não a via e estava com saudades dela e na esperança que ela pudesse me dar algum sábio conselho. Conversamos sobre Aline e Ingrid e chegamos as mesmas conclusões sobre Agatha ter adiado aquilo por tanto tempo por temor de se sentir rejeitada e de alguma forma aquilo também serviria para ela como um recomeço. Sobre Aline e o bebê não havia nada mais além do que lamentar. Antes de sair do colégio e voltar para casa fiquei tomando um café na cantina e nesse momento Daniela apareceu falar comigo com Flávia uma das professoras do colégio. Ela nos apresentou e disse que no dia seguinte seriamos visitas em casa devido um jantar que minha mãe estaria fazendo para alguns amigos dela e alguns parentes de visita. Mesmo em meio a tantas coisas e momentos complicados fiquei fascinado com a beleza de Flávia e no dia seguinte no jantar me esquivei das conversas chatas e comentários duma tia chata que estava de visita e passei boa parte da noite tentando me aproximar de Flávia. Com uma certa ajuda de Daniela consegui levar Flávia para um canto sossegado da casa e ficamos conversando a três e depois apenas eu e Flávia até o final daquela pequena recepção pós jantar.

Terminado o jantar fomos para uma das baladas da cidade e os dias seguintes passei entre baladas, almoços e jantares com Flávia e alguns passeios. Pode até parecer fútil agir assim logo depois de tantos fatos extremamente complexos, mas estar com Flávia me servia mais como um passatempo e meio de fazer as coisas tomarem o mais rápido o possível a normalidade. Nas horas em que estou sozinho é inevitável que este ou aquele acontecimento não venha requerer contas com a consciência. Visto que não há nada a fazer a não ser lembrar e repensar nisso ou aquilo com algum arrependimento ou alívio o certo é que se ficarmos estagnados no passado será o nosso futuro o comprometido. Depois do final de semana leve e solto em companhia daquela professora loira de olhos celestes e jeitinho meigo parti para Ilha Bela prestigiar Paolo numa competição de vela.


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