Chegando em casa
fui recepcionado pelo cãozinho de titia Charlô que me recebeu apropriadamente
com euforia mijona pela minha chegada repleta de presentes cafonas para todos.
Especialmente para Marie que sempre fora a mais pidona à exemplo da avó paterna. Eu não tinha sido o único a chegar naquele
dia. Tia Fanny e mais três primas e uma afilhada dela estavam no hall de entrada como se aquilo
fosse uma comitiva de recepção feminina para um soldado que chegou da guerra. O
único marmajo era meu irmão que parecia estar mais preocupado em saber se tinha
lhe trazido alguma garrafa de bebida.
Entre um
cafezinho e sucos e um papo e outro logo fui me familiarizando novamente com
pessoas que não encontrava de longa data como Bruna minha prima em segundo grau
e Ana Laura a afilhada de Tia Fanny. Estavam cada uma ao seu modo duas mulheres
lindas e mantinham ainda cada qual ainda o jeito provocante de Bond Girl do mal
e a outra o estilo low profile e sereno deixando toda atenção de qualquer
pessoa voltada ao belo par de olhos profundamente azuis emoldurada por cabelos
negros lisos. Conversei pouco e logo fui
me entreter com Ivan no quintal, estava aflito por tê-lo deixado tanto tempo
com as avós e irmãs e conversar sobre carrinhos e gibis era quase impossível
via internet devido a agitação dele. Marie logo veio me cobrar de seus
souvenirs e contar fofocas da casa. Fiquei com ambos alguns momentos caminhando
pelo jardim dos fundos ouvindo a tagarela da minha filha destrinchar fatos
desinteressantes e outros capitais sobre aquelas últimas semanas. Quando ela
realmente adentrou num assunto sério foi sobre a viagem que fariam para
Chamonix junto de Ing, Agatha tia Charlote e mamãe e sobre a ida delas para
estudar fora do país.
Aquela viagem já
era o prenuncio de que minha mãe tinha conseguido atingir seus objetivos de conseguir
vaga para Ingrid e Marie num colégio suíço de preparação. Isso eu já antevia
ainda sem acreditar na real possibilidade disso. Mas como Marie, Ingrid e até
Agatha estavam se esmerando em aulas de francês há alguma tempo tudo aquilo me
chamava a atenção para um movimento estratégico oculto que não dei muita bola
apesar disso. Minha mãe só me comunicaria isso no final daquela semana
juntamente de seu colegiado de defensoras da causa onde todas estavam de pleno
acordo em mudar-se para lá visando iniciar os estudos na Europa. Só notava uma
pequena indecisão em Marie que estava começando a gostar das suas tarefas
extra-colégio e estava se saindo bem nos seus afazeres no escritório. Fiquei um tanto decepcionado pela notícia
devido não fazer parte dos meus planos acompanhá-las nessa empreitada in loco.
Meu irmão também tinha objetivos comuns em mudar-se para França com sua filha e
recomeçar nova vida e usaria isso como trampolim visto que minha mãe inclui-o
nos planos da Suíça. Minha mãe tinha realizado todo esse projeto com base na
sua capacidade de persuasão e ascendência sobre as garotas, não tinha como
negar que ela tinha feito a cabeça delas, e conseguiu preparar nas minhas
tantas ausências um caminho mais abreviado para um processo que eu queria que
fosse um pouco mais extenso e gradual.
Essa notícia
significava que o futuro com Agatha era uma preocupação e menos e tudo que
houvesse de bom ou ruim dali por diante teria um desfecho inevitável que era a
separação. Isso me aliviou de certa forma, pois naquela mesma terça à noite que
havia chegado passamos a noite juntos. Ela com seu novo look engenhado por
Marie com cabelos tom de chocolate estava com um vestido rosa shock parecendo
mais uma adolescente do que a velha e repetida garota country de sempre. Foi a
última noite que passamos juntos, na quarta tudo já viria abaixo ao aceitar um
convite de Daniela para acompanhá-la na festa de aniversário de Flávia que
insistia para que comparecesse naquela festa. Aquele convite já estava agendado
e sentia que Flávia estava me rondando novamente já fazia algumas semanas de
forma discreta e indireta e direta. Por
não ter mais me visto ao lado de Agatha, ao menos não em público depois daquele
incidente estúpido de Agatha ter aceito o meu pedido e depois jogado tudo fora,
Flávia parecia querer ocupar o posto deixado pela desastrada rival de colégio.
Ambas pareciam ter uma certa antipatia comum uma pela outra que era velada no
trabalho, mas evidenciada em outros cantos conforme Dani me informava fazendo
uma espécie de advogada do diabo.
Um jantar
simples, pouco conversei com a aniversariante, embora o flerte dela fosse
evidente, mas aquilo foi o suficiente para no dia seguinte Agatha dar o seu
chilique de ciúmes emanando todos os tons de posse e insegurança imatura que
faziam jus ao look adolescente dela. Saí conversar com ela naquele final de
tarde no colégio depois de assistir um jogo de vôlei por lá para me distrair.
Saímos de carro e paramos num lugar calmo e sem movimento. Escutei todas as
acusações infundadas dela calado. Como já estava indeciso e confuso sobre o que
esperar dum futuro com ela aquilo tudo foi a linha divisora de águas. Quando
ela terminou de esbravejar e me acusar de estar mantendo um “caso secreto” com
Flávia e com ela ao mesmo tempo a coisa me soou tão despropositada que a minha
única reação foi despejar ironia e sarcasmo para cima dela, poupando ela dum
longo sermão devido ter sido ela a ter feito antes o que agora me acusava.
Quando ela terminou seus últimos atos definindo tudo ao dizer para não mais
procurá-la selei com ela um acordo de aquilo tudo entre nós nunca deveria
chegar até Ingrid. Até pensei em consolar ela várias vezes e fazer ela recobrar
a calma durante o discurso acusativo inflamado dela, mas isso não fazia mais
sentido. Afinal era ela quem acusava e terminava tudo crendo que de fato eu
estava novamente com Flávia devido o simples fato de ter comparecido ao
aniversário dela sem a menor intenção de cortejá-la novamente.
A ideia até
aquele momento era apenas fato na cabeça de Agatha, mas o enredo dela era tão
convincente que resolvi torná-lo um acontecimento real como se fosse uma
espécie de punição por ela ter em certo momento dito me querer e voltado atrás
ficando com outro por algumas semanas até cair na real. Não era vingança era um
meio de colocar um ponto final definitivo naquela história que aparentemente
tinha algo em sua essência que jamais daria certo. Após levar Agatha para casa
telefonei para Flávia e coloquei as cartas na mesa. Nisso havia uma clara
evidencia que Daniela de advogada do diabo e diplomata que parecia querer selar a paz entre Palestina e Israel não tinha
nada. Ela estava também contra Agatha devido ela estar se tornando uma espécie
de ameaça à posição dela no colégio. Ao menos era essa a teoria conspiratória
que estava circulando nos corredores. No fundo isso não me interessava, o que
tinha a fazer agora era tornar fato as acusações de Agatha e isso foi mais
simples do que imaginava. Bastou telefonar para Flávia e ela rapidamente abriu
o jogo sem fazer rodeios. Disse que tinha sido um erro nossa separação meses
atrás e que tinha se arrependido e não sabia como reatar. Sentia sinceridade
nela, mas isso também pouco me importava, queria mesmo é usar tudo aquilo para
fechar um ciclo. Por mais manipulador que possa parecer era a chance mais fácil
e à mão de matar e enterrar aquela história de vez com Agatha e tocar o barco
em frente. Naquele momento não houve em nenhum momento de crise de consciência
digna de Felipe Barreto depois de ter desvirginado uma tolinha e se tornando
inimigo mortal da mesma. A coisa na minha mente estava calibrada e voltada para
abrir novas possibilidades tendo em vista tudo que estava ocorrendo sem sair do
lugar há algum tempo.
Fiquei horas
conversando com Flávia na casa dela, cartas na mesa, nenhum ressentimento e
tudo acertado pegamos no sono no sofá assistindo um filme como se nunca
tivéssemos decidido antes em deixar um ao outro tempo antes cada qual com seus
motivos não confessos na ocasião. Acordei cansado por dormir torto no sofá,
levei ela para o quarto e fui embora, pois sabia que Ivan estava meio febril e
Marie como sempre dorme como uma pedra. Me senti irresponsável no caminho para
casa, logo essa sensação passou e o mode fuck all estava on mais uma vez. Ao
chegar em casa estava tudo bem com Ivan. Tomei um banho e arrumei as coisas dele para
ir buscar Bia que estava para sair da clínica de repouso. Ele parecia não estar
disposto a sair da cama, deixei ele dormindo mais um tempo e foi Marie quem
conseguiu tirar ele da cama e arrumá-lo com seu habitual poder de convencimento:
a insistência. Enquanto isso estava na cozinha conversando com Tia Fanny e Ana
Laura que tinha sido escolhida para ser a sua manda chuva nos negócios que
queria realizar comigo. Ela nos deixou e fiquei com titia falando de outros
assuntos, assim que Laura deixou a mesa titia me disse: A Ana é uma boa moça –
A expressão me soou como: “Não se meta com ela seu cafajeste ela não é para o
seu bico são só negócios”. Minha tia tem um tom enigmático e mais autoritário
que a minha mãe e fiquei sem compreender a razão dela ter sublinhado o caráter
e personalidade de Ana Laura que na manhã anterior havia agido comigo também de
forma autoritária ao me flagrar fumando um cigarro logo pela manhã na presença
do Ivan que tomava sua caneca de sucrilhos.
Apesar da bronca
ter sido em tom de professora antiquada, ela se sentou na mesa do jardim e
conversou comigo com toda sua simpatia e timidez dando flashs a todo momento de
rubor no rosto. Nem parecia uma advogada executiva que poderia tomar conta dos
interesses de titia como sua procuradora. Laura falava muito sem dizer nada de
conclusivo sobre assunto algum. Aqueles olhos azuis eram mais interessantes do
que o mundo ao redor e não me ocupava em dar atenção a mais nada a não ser a
beleza dela naquela mesa pouco me importando com o que ela falava. Ela
facilmente conquistou a atenção do Ivan também que depois daquilo era o
chaveirinho dela pela casa durante aquela quinta feira que tinha sido
efervescente de intrigas fora dos muros daquele chateaux de Madame
Monique. Logo Bruna, minha prima, com
sua dose de mau humor e indelicadeza matinal surgiu sem nos dar bom dia. O
jeito rebelde do pai era traço marcante dela e foi o que me fez dez anos antes
ter ficado com ela numa viagem ao Mato Grosso do Sul que parecia ser o lugar
dos cosmos onde as primas eram desvirginadas por um primo sem noção do
perigo. Foi bem na entre safra de quando
Camila me deixou sem notícias para casar com o mauricinho mineiro que isso
aconteceu. Depois daquilo perdemos o contato e eu nesses acasos e caprichos do
destino acabei voltando para Camila. Bruna continuava sendo exuberante,
arrogante e simplesmente ela mesma independente de tentativas de tia Fanny
colocá-la na linha. Ela tinha se tornado
uma mulher sensual e muito “pra frente” que para os padrões daquela família de
mulheres caretas. Somente ela e minha sobrinha e talvez Marie tinham aquele
senso de transgressão das “tradicionais regras da casa” para as mulheres. Isso
me deixava mais uma vez atraído por ela do que pelos olhos azuis de Laura com
seu jeito tímido e aparentemente cheio de não me toques.
Retornemos a
sexta de manhã novamente: Fui com Ivan buscar Bia, ela estava ótima, o dia das
bruxas tinha animado sua imaginação e ela logo trouxe Ivan para o seu mundinho
de contos de bruxas e vampiros. Parecia que os remédios e terapias em doses diárias
estavam recuperando aparentemente o lado jovial e ativo dela. Deixei eles na
casa dela, e passei lá ao final da tarde para ver como estavam ficando até a
hora do janta indo depois para casa de Flávia que tinha me ligado depois de
chegar da academia. Bia estava tão equilibrada e demonstrando controle
emocional e curada duma anemia. Estava muito confiante ao ponto de fazer planos
para o final de ano com Ivan numa viagem mãe e filho. Conversamos um pouco
sobre aquilo e entramos num acordo de dar tempo ao tempo sob a promessa
incondicional dela tomar os remédios e fazer terapia sem deixar a peteca cair.
Jantei com eles e segui para casa de Flávia onde passei a noite. Evitei voltar
para casa para não brigar com mamãe. Em casa já sabia que ela me esperava para
dar os detalhes e anunciar que no próximo ano Marie e Ingrid tinham seguido os
planos dela e não os meus. Ambas tinham me dito todos os detalhes e demonstrado
estar de acordo integral com as propostas de mamãe apesar de Marie hesitar numa
coisa ou outra. Não tinha espaço para bater de frente com as meninas, mas minha
mãe me devia explicações disso que julgava ser mais uma das traições dela.
Passei o final de tarde com Bia remoendo aquilo e só tive um pouco de paz na
casa de Flávia quando ela se despiu e me levou para o lado oculto da lua
naquela noite quente e caliente de primavera.
De manhã, um
café a dois naquela pequena casa aconchegante de Flávia e ela iria para uma
série de compromissos com suas amigas, tais como chás de casamento e compras,
combinamos de nos vermos a noite. Voltei para casa, conversei com a velha
francesa a sós, ouvindo cada ponto a favor do plano dela feito as ocultas.
Disse que não iria me opor, mas que da próxima vez que ela armasse algo em
segredo ela iria pagar caro, pois iria tomar aquilo como algo pessoal daqui pra
frente e não como um bem que uma avó ou mãe quer fazer em favor de netos e
filhos. Ela sentiu a dureza do que disse e ficou constrangida. Apesar de não
ter gostado de ter feito isso e estar furioso com ela tratei aquilo com base no
respeito que ela merecia por ser minha mãe, porém deixei o aviso duro e bem
refletido por não ser intempestivo e saber que ela seria capaz de fazer
novamente coisas do mesmo tipo como manter Agatha e Ingrid anos numa condição
de reféns duma suposta proteção sob o controle dela. Não era necessário jogar
detalhes e fatos na cara dela, mamãe tinha compreendido a força do recado e a
minha decepção com ela e ficou abalada.
Saí almoçar com
as meninas sem tocar no assunto, quando voltamos para casa passei a tarde no
home office resolvendo via telefonemas e conversas de computador uma briga que
havia ocorrido entre um cliente e um de meus sócios e depois entre sócios no
dia anterior. Parecia que o meu estilo de conduzir a empresa e liderança estava
começando a entrar em atrito com a segurança dos meus sócios conduzirem os
negócios devido minha ausência em São Paulo. Isso me dava uma noção prematura
de que algo de errado poderia estar acontecendo lá dentro e que precisava
oxigenar certos setores e voltar ter uma presença mais próxima do cotidiano da
sede em São Paulo ou criar uma divisão de poderes entre eles maior ainda para
que não tivessem meios de unir-se ou desunir-se ainda mais numa eventual decisão
que pudesse contrariar a minha ótica de gerenciamento e decisões finais.
Esses incidentes
tinham se tornado algo corriqueiro nos últimos meses, mas a linha de reparação
de danos e desentendimentos estava até então amena. O acumulo parecia ter
colocado Marcos contra Augusto devido uma ingerência e quebra de hierarquia.
Isso eu já havia percebido antes. Enquanto um seguia os procedimentos como o
planejado o outro fazia pequenos ajustes que só eram comunidades posteriormente
para direção. Isso não é nada agradável e saudável numa relação de negócios
tanto quanto numa relação pessoal. No
entanto, eu tinha a pessoa certa para representar meus interesses e realocar as
coisas nos próximos anos. Meu pai estava ocioso em seu rancho e sempre tentando
reconciliação comigo e com minha irmã nos negócios depois de várias disputas
judiciais. Liguei para ele e para ela e expliquei os meus planos e ambos
fecharam um acordo de parceria comigo que seriam meus olhos e ouvidos e minha
mão invisível na sede enquanto eu cuidava de outras atividades extra-empresa e
na divisão que estava começando a funcionar no Paraná e voltando a funcionar no
Mato Grosso do Sul devido a proposta de Tia Fanny em passar sua rede de hotéis fazenda de
lá em troca de imóveis e outras fontes de renda no Paraná que ficariam a cargo
de minha pessoa na gestão sendo Ana Laura e minhas primas Bruna e Giovana uma
espécie de aprendizes de feiticeiro nos negócios ou sub-gerentes. A proposta
era vantajosa e a fama de ético e bons lucros me davam total aval para comandar
essa transição de imediato.
Passei aquela
tarde resolvendo detalhes sobre esses assuntos para segunda feira navegar para
águas mais profundas e lançar minhas redes em busca de novos cardumes. Apesar
da intrigas e golpes do destino havia por onde e como tirar proveito de cada
fato adverso seja do passado ou presente.
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