sábado, 1 de novembro de 2014

Intrigas palacianas


Chegando em casa fui recepcionado pelo cãozinho de titia Charlô que me recebeu apropriadamente com euforia mijona pela minha chegada repleta de presentes cafonas para todos. Especialmente para Marie que sempre fora a mais pidona à exemplo da avó paterna.  Eu não tinha sido o único a chegar naquele dia. Tia Fanny e mais três primas e uma afilhada  dela estavam no hall de entrada como se aquilo fosse uma comitiva de recepção feminina para um soldado que chegou da guerra. O único marmajo era meu irmão que parecia estar mais preocupado em saber se tinha lhe trazido alguma garrafa de bebida.


Entre um cafezinho e sucos e um papo e outro logo fui me familiarizando novamente com pessoas que não encontrava de longa data como Bruna minha prima em segundo grau e Ana Laura a afilhada de Tia Fanny. Estavam cada uma ao seu modo duas mulheres lindas e mantinham ainda cada qual ainda o jeito provocante de Bond Girl do mal e a outra o estilo low profile e sereno deixando toda atenção de qualquer pessoa voltada ao belo par de olhos profundamente azuis emoldurada por cabelos negros lisos.  Conversei pouco e logo fui me entreter com Ivan no quintal, estava aflito por tê-lo deixado tanto tempo com as avós e irmãs e conversar sobre carrinhos e gibis era quase impossível via internet devido a agitação dele. Marie logo veio me cobrar de seus souvenirs e contar fofocas da casa. Fiquei com ambos alguns momentos caminhando pelo jardim dos fundos ouvindo a tagarela da minha filha destrinchar fatos desinteressantes e outros capitais sobre aquelas últimas semanas. Quando ela realmente adentrou num assunto sério foi sobre a viagem que fariam para Chamonix junto de Ing, Agatha tia Charlote e mamãe e sobre a ida delas para estudar fora do país.



Aquela viagem já era o prenuncio de que minha mãe tinha conseguido atingir seus objetivos de conseguir vaga para Ingrid e Marie num colégio suíço de preparação. Isso eu já antevia ainda sem acreditar na real possibilidade disso. Mas como Marie, Ingrid e até Agatha estavam se esmerando em aulas de francês há alguma tempo tudo aquilo me chamava a atenção para um movimento estratégico oculto que não dei muita bola apesar disso. Minha mãe só me comunicaria isso no final daquela semana juntamente de seu colegiado de defensoras da causa onde todas estavam de pleno acordo em mudar-se para lá visando iniciar os estudos na Europa. Só notava uma pequena indecisão em Marie que estava começando a gostar das suas tarefas extra-colégio e estava se saindo bem nos seus afazeres no escritório.  Fiquei um tanto decepcionado pela notícia devido não fazer parte dos meus planos acompanhá-las nessa empreitada in loco. Meu irmão também tinha objetivos comuns em mudar-se para França com sua filha e recomeçar nova vida e usaria isso como trampolim visto que minha mãe inclui-o nos planos da Suíça. Minha mãe tinha realizado todo esse projeto com base na sua capacidade de persuasão e ascendência sobre as garotas, não tinha como negar que ela tinha feito a cabeça delas, e conseguiu preparar nas minhas tantas ausências um caminho mais abreviado para um processo que eu queria que fosse um pouco mais extenso e gradual.


Essa notícia significava que o futuro com Agatha era uma preocupação e menos e tudo que houvesse de bom ou ruim dali por diante teria um desfecho inevitável que era a separação. Isso me aliviou de certa forma, pois naquela mesma terça à noite que havia chegado passamos a noite juntos. Ela com seu novo look engenhado por Marie com cabelos tom de chocolate estava com um vestido rosa shock parecendo mais uma adolescente do que a velha e repetida garota country de sempre. Foi a última noite que passamos juntos, na quarta tudo já viria abaixo ao aceitar um convite de Daniela para acompanhá-la na festa de aniversário de Flávia que insistia para que comparecesse naquela festa. Aquele convite já estava agendado e sentia que Flávia estava me rondando novamente já fazia algumas semanas de forma discreta e indireta e direta.  Por não ter mais me visto ao lado de Agatha, ao menos não em público depois daquele incidente estúpido de Agatha ter aceito o meu pedido e depois jogado tudo fora, Flávia parecia querer ocupar o posto deixado pela desastrada rival de colégio. Ambas pareciam ter uma certa antipatia comum uma pela outra que era velada no trabalho, mas evidenciada em outros cantos conforme Dani me informava fazendo uma espécie de advogada do diabo.



Um jantar simples, pouco conversei com a aniversariante, embora o flerte dela fosse evidente, mas aquilo foi o suficiente para no dia seguinte Agatha dar o seu chilique de ciúmes emanando todos os tons de posse e insegurança imatura que faziam jus ao look adolescente dela. Saí conversar com ela naquele final de tarde no colégio depois de assistir um jogo de vôlei por lá para me distrair. Saímos de carro e paramos num lugar calmo e sem movimento. Escutei todas as acusações infundadas dela calado. Como já estava indeciso e confuso sobre o que esperar dum futuro com ela aquilo tudo foi a linha divisora de águas. Quando ela terminou de esbravejar e me acusar de estar mantendo um “caso secreto” com Flávia e com ela ao mesmo tempo a coisa me soou tão despropositada que a minha única reação foi despejar ironia e sarcasmo para cima dela, poupando ela dum longo sermão devido ter sido ela a ter feito antes o que agora me acusava. Quando ela terminou seus últimos atos definindo tudo ao dizer para não mais procurá-la selei com ela um acordo de aquilo tudo entre nós nunca deveria chegar até Ingrid. Até pensei em consolar ela várias vezes e fazer ela recobrar a calma durante o discurso acusativo inflamado dela, mas isso não fazia mais sentido. Afinal era ela quem acusava e terminava tudo crendo que de fato eu estava novamente com Flávia devido o simples fato de ter comparecido ao aniversário dela sem a menor intenção de cortejá-la novamente.


A ideia até aquele momento era apenas fato na cabeça de Agatha, mas o enredo dela era tão convincente que resolvi torná-lo um acontecimento real como se fosse uma espécie de punição por ela ter em certo momento dito me querer e voltado atrás ficando com outro por algumas semanas até cair na real. Não era vingança era um meio de colocar um ponto final definitivo naquela história que aparentemente tinha algo em sua essência que jamais daria certo. Após levar Agatha para casa telefonei para Flávia e coloquei as cartas na mesa. Nisso havia uma clara evidencia que Daniela de advogada do diabo e diplomata que parecia querer  selar a paz entre Palestina e Israel não tinha nada. Ela estava também contra Agatha devido ela estar se tornando uma espécie de ameaça à posição dela no colégio. Ao menos era essa a teoria conspiratória que estava circulando nos corredores. No fundo isso não me interessava, o que tinha a fazer agora era tornar fato as acusações de Agatha e isso foi mais simples do que imaginava. Bastou telefonar para Flávia e ela rapidamente abriu o jogo sem fazer rodeios. Disse que tinha sido um erro nossa separação meses atrás e que tinha se arrependido e não sabia como reatar. Sentia sinceridade nela, mas isso também pouco me importava, queria mesmo é usar tudo aquilo para fechar um ciclo. Por mais manipulador que possa parecer era a chance mais fácil e à mão de matar e enterrar aquela história de vez com Agatha e tocar o barco em frente. Naquele momento não houve em nenhum momento de crise de consciência digna de Felipe Barreto depois de ter desvirginado uma tolinha e se tornando inimigo mortal da mesma. A coisa na minha mente estava calibrada e voltada para abrir novas possibilidades tendo em vista tudo que estava ocorrendo sem sair do lugar há algum tempo.




Fiquei horas conversando com Flávia na casa dela, cartas na mesa, nenhum ressentimento e tudo acertado pegamos no sono no sofá assistindo um filme como se nunca tivéssemos decidido antes em deixar um ao outro tempo antes cada qual com seus motivos não confessos na ocasião.  Acordei cansado por dormir torto no sofá, levei ela para o quarto e fui embora, pois sabia que Ivan estava meio febril e Marie como sempre dorme como uma pedra. Me senti irresponsável no caminho para casa, logo essa sensação passou e o mode fuck all estava on mais uma vez. Ao chegar em casa estava tudo bem com Ivan.  Tomei um banho e arrumei as coisas dele para ir buscar Bia que estava para sair da clínica de repouso. Ele parecia não estar disposto a sair da cama, deixei ele dormindo mais um tempo e foi Marie quem conseguiu tirar ele da cama e arrumá-lo com seu habitual poder de convencimento: a insistência. Enquanto isso estava na cozinha conversando com Tia Fanny e Ana Laura que tinha sido escolhida para ser a sua manda chuva nos negócios que queria realizar comigo. Ela nos deixou e fiquei com titia falando de outros assuntos, assim que Laura deixou a mesa titia me disse: A Ana é uma boa moça – A expressão me soou como: “Não se meta com ela seu cafajeste ela não é para o seu bico são só negócios”. Minha tia tem um tom enigmático e mais autoritário que a minha mãe e fiquei sem compreender a razão dela ter sublinhado o caráter e personalidade de Ana Laura que na manhã anterior havia agido comigo também de forma autoritária ao me flagrar fumando um cigarro logo pela manhã na presença do Ivan que tomava sua caneca de sucrilhos.

Apesar da bronca ter sido em tom de professora antiquada, ela se sentou na mesa do jardim e conversou comigo com toda sua simpatia e timidez dando flashs a todo momento de rubor no rosto. Nem parecia uma advogada executiva que poderia tomar conta dos interesses de titia como sua procuradora. Laura falava muito sem dizer nada de conclusivo sobre assunto algum. Aqueles olhos azuis eram mais interessantes do que o mundo ao redor e não me ocupava em dar atenção a mais nada a não ser a beleza dela naquela mesa pouco me importando com o que ela falava. Ela facilmente conquistou a atenção do Ivan também que depois daquilo era o chaveirinho dela pela casa durante aquela quinta feira que tinha sido efervescente de intrigas fora dos muros daquele chateaux de Madame Monique.  Logo Bruna, minha prima, com sua dose de mau humor e indelicadeza matinal surgiu sem nos dar bom dia. O jeito rebelde do pai era traço marcante dela e foi o que me fez dez anos antes ter ficado com ela numa viagem ao Mato Grosso do Sul que parecia ser o lugar dos cosmos onde as primas eram desvirginadas por um primo sem noção do perigo.  Foi bem na entre safra de quando Camila me deixou sem notícias para casar com o mauricinho mineiro que isso aconteceu. Depois daquilo perdemos o contato e eu nesses acasos e caprichos do destino acabei voltando para Camila. Bruna continuava sendo exuberante, arrogante e simplesmente ela mesma independente de tentativas de tia Fanny colocá-la na linha.  Ela tinha se tornado uma mulher sensual e muito “pra frente” que para os padrões daquela família de mulheres caretas. Somente ela e minha sobrinha e talvez Marie tinham aquele senso de transgressão das “tradicionais regras da casa” para as mulheres. Isso me deixava mais uma vez atraído por ela do que pelos olhos azuis de Laura com seu jeito tímido e aparentemente cheio de não me toques.



Retornemos a sexta de manhã novamente: Fui com Ivan buscar Bia, ela estava ótima, o dia das bruxas tinha animado sua imaginação e ela logo trouxe Ivan para o seu mundinho de contos de bruxas e vampiros. Parecia que os remédios e terapias em doses diárias estavam recuperando aparentemente o lado jovial e ativo dela. Deixei eles na casa dela, e passei lá ao final da tarde para ver como estavam ficando até a hora do janta indo depois para casa de Flávia que tinha me ligado depois de chegar da academia. Bia estava tão equilibrada e demonstrando controle emocional e curada duma anemia. Estava muito confiante ao ponto de fazer planos para o final de ano com Ivan numa viagem mãe e filho. Conversamos um pouco sobre aquilo e entramos num acordo de dar tempo ao tempo sob a promessa incondicional dela tomar os remédios e fazer terapia sem deixar a peteca cair. Jantei com eles e segui para casa de Flávia onde passei a noite. Evitei voltar para casa para não brigar com mamãe. Em casa já sabia que ela me esperava para dar os detalhes e anunciar que no próximo ano Marie e Ingrid tinham seguido os planos dela e não os meus. Ambas tinham me dito todos os detalhes e demonstrado estar de acordo integral com as propostas de mamãe apesar de Marie hesitar numa coisa ou outra. Não tinha espaço para bater de frente com as meninas, mas minha mãe me devia explicações disso que julgava ser mais uma das traições dela. Passei o final de tarde com Bia remoendo aquilo e só tive um pouco de paz na casa de Flávia quando ela se despiu e me levou para o lado oculto da lua naquela noite quente e caliente de primavera.

De manhã, um café a dois naquela pequena casa aconchegante de Flávia e ela iria para uma série de compromissos com suas amigas, tais como chás de casamento e compras, combinamos de nos vermos a noite. Voltei para casa, conversei com a velha francesa a sós, ouvindo cada ponto a favor do plano dela feito as ocultas. Disse que não iria me opor, mas que da próxima vez que ela armasse algo em segredo ela iria pagar caro, pois iria tomar aquilo como algo pessoal daqui pra frente e não como um bem que uma avó ou mãe quer fazer em favor de netos e filhos. Ela sentiu a dureza do que disse e ficou constrangida. Apesar de não ter gostado de ter feito isso e estar furioso com ela tratei aquilo com base no respeito que ela merecia por ser minha mãe, porém deixei o aviso duro e bem refletido por não ser intempestivo e saber que ela seria capaz de fazer novamente coisas do mesmo tipo como manter Agatha e Ingrid anos numa condição de reféns duma suposta proteção sob o controle dela. Não era necessário jogar detalhes e fatos na cara dela, mamãe tinha compreendido a força do recado e a minha decepção com ela e ficou abalada.

Saí almoçar com as meninas sem tocar no assunto, quando voltamos para casa passei a tarde no home office resolvendo via telefonemas e conversas de computador uma briga que havia ocorrido entre um cliente e um de meus sócios e depois entre sócios no dia anterior. Parecia que o meu estilo de conduzir a empresa e liderança estava começando a entrar em atrito com a segurança dos meus sócios conduzirem os negócios devido minha ausência em São Paulo. Isso me dava uma noção prematura de que algo de errado poderia estar acontecendo lá dentro e que precisava oxigenar certos setores e voltar ter uma presença mais próxima do cotidiano da sede em São Paulo ou criar uma divisão de poderes entre eles maior ainda para que não tivessem meios de unir-se ou desunir-se ainda mais numa eventual decisão que pudesse contrariar a minha ótica de gerenciamento e decisões finais.


Esses incidentes tinham se tornado algo corriqueiro nos últimos meses, mas a linha de reparação de danos e desentendimentos estava até então amena. O acumulo parecia ter colocado Marcos contra Augusto devido uma ingerência e quebra de hierarquia. Isso eu já havia percebido antes. Enquanto um seguia os procedimentos como o planejado o outro fazia pequenos ajustes que só eram comunidades posteriormente para direção. Isso não é nada agradável e saudável numa relação de negócios tanto quanto numa relação pessoal.  No entanto, eu tinha a pessoa certa para representar meus interesses e realocar as coisas nos próximos anos. Meu pai estava ocioso em seu rancho e sempre tentando reconciliação comigo e com minha irmã nos negócios depois de várias disputas judiciais. Liguei para ele e para ela e expliquei os meus planos e ambos fecharam um acordo de parceria comigo que seriam meus olhos e ouvidos e minha mão invisível na sede enquanto eu cuidava de outras atividades extra-empresa e na divisão que estava começando a funcionar no Paraná e voltando a funcionar no Mato Grosso do Sul devido a proposta de Tia Fanny em passar sua rede de hotéis fazenda de lá em troca de imóveis e outras fontes de renda no Paraná que ficariam a cargo de minha pessoa na gestão sendo Ana Laura e minhas primas Bruna e Giovana uma espécie de aprendizes de feiticeiro nos negócios ou sub-gerentes. A proposta era vantajosa e a fama de ético e bons lucros me davam total aval para comandar essa transição de imediato.


Passei aquela tarde resolvendo detalhes sobre esses assuntos para segunda feira navegar para águas mais profundas e lançar minhas redes em busca de novos cardumes. Apesar da intrigas e golpes do destino havia por onde e como tirar proveito de cada fato adverso seja do passado ou presente.          

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