Um dos meus escritores prediletos
disse certa vez: “Que nossos vícios sejam comparados aos temporais, às
tempestades, aos furacões!” – Disse ainda o seguinte: “O que a mulher mais
velha oferece ao homem mais moço é antes de tudo a certeza de que seu amor se
desenvolverá longe de qualquer risco matrimonial”. Naquela noite, depois de ter
retornado da viagem alguns dias, depois de ter conhecido Luíza e Marie ter
bancado o cupido, lá estava eu, mais uma vez, de volta ao meu vício preferido,
que é manter ou ter casos passageiros com qualquer mulher tenhas ardores
eróticos e beleza que me atraiam. Não é necessário que essas mulheres sejam escolhidas
a dedo, basta apenas que elas cruzem o meu caminho e que me sinta atraído por
elas ou alguma delas por mim. Basta que ambos os lados cedam aos desejos mais
intensos da carne e queiram concretizar suas vontades sem medir consequencias.
Consequencias que tantos outros medem e desejos que represam em si mesmos
aguardando alguém perfeito para desaguarem ardor e desejo. Muitas vezes essa
pessoa idealizada, romantizada, nunca surge e certas pessoas passam a vida numa
solidão formal que aceitam como obra do destino. Desde muito cedo em minha vida
sempre tentei ser o oposto desse tipo de pessoa que se deixa ficar a sombra dos
acontecimentos. Mesmos seguindo intuições, desejos e vontades muitas vezes
ficamos fadados aos caprichos do destino. Diante disso, tentar reprimir algum
acontecimento ou qualquer outro medindo as causas e efeitos nunca foi o meu
forte.
Na manhã seguinte, após uma noite com
a vizinha infiel, a qual ainda tinha ainda um estilo jovem no modo de falar e
se comportar o telefone toca e nos acorda. Do outro lado da linha a voz de
soprano e fala rápida de Marie questionava se na próxima semana estaria em São
Paulo, e cogitava planos de ir com Luíza me visitar no próximo final de semana.
Confirmei que estaria por lá, e logo Marie passou o telefone para Luíza que com
sua voz lenta e doce de contralto confirmou os detalhes finais desse primeiro
reencontro e desligou, sem sequer imaginar que deitada sobre meu peito estava
uma mulher, talvez até trinta anos mais velha que ela, que por sua vez com sua
voz rouca típica de quem acaba de acordar me diz tocando com a ponta do
indicador nos meus lábios como se fosse um telegrafo: Sabia que essa boca é
muito gostosa? Respondi cinicamente:
Modéstia a parte, tudo em mim é gostoso não acha? A vizinha infiel retrucou:
Taí uma coisa que você é e outra que você não é. Você não é modesto, você é
orgulhoso, muito orgulhoso, e isso me agrada em você; e o seu jeito de homem
arrogante de gostosão também! - Mal tive tempo de responder ela se levantou
colocou suas roupas, arrumou o cabelo no espelho e disse apenas: Depois nos
falamos! Tchau querido! Fez um coraçãozinho, mandou um beijo e sumiu por
semanas.
A semana seguinte já estava definida,
passar dias e dias em reuniões e encontrar as garotas em São Paulo. Passei boa
parte da semana recluso em reuniões longas me focando nos afazeres, evitei ao
máximo fazer previsões ou antecipações proféticas do futuro, apenas delimitei
as possibilidades que poderia ter com Luíza ou Aline, com isso deixaria tudo ao
poder do acaso sem me aprofundar no que poderia a acontecer. Isso me levava a
crer que Aline estava de um lado da moeda e Luíza de outro. Seria o destino a
resolver o cara e coroa entre as duas. Uma coisa simples e banal me levou a
inventar essa possibilidade. Luíza logo que voltou de viagem tinha desfeito o
seu romance água com açúcar com seu namoradinho de faculdade. Contou honestamente
que tinha conhecido outra pessoa na viagem, além disso, contou, dessa vez para
mim, um outro fato aditivo a esse, que havia outro cara dando em cima dela, um
cara quase da minha idade que tentava fazer ela deixar o garoto da faculdade
para namorar com ele. Ante a esses fatos isso me fazia acreditar, que mesmo tão
disputada por sujeitos que tinham uma vantagem de estarem no mesmo lugar que
ela, enquanto eu estava distante em outra cidade, isso me fazia acreditar que
por algum motivo ela tinha optado por mim de forma bastante convicta e não
seria, ao menos para ela, uma aventura passageira de viagem. Ao menos para mim,
não importava o motivo dessa escolha dela, nem mesmo o quanto a história fosse
durar, ela tinha deixando um e recusado outro e apostado suas fichas em mim.
Essa confissão dela, estranhamente me
causou a sensação típica dum garoto adolescente que sente-se o preferido pela
garota mais bonita da escola e que diante disso não faz nada além de ficar na
dele e aproveitar os acontecimentos. Naquele final de semana em companhia dela
e Marie, também pude notar que amizade delas era algo bom e possivelmente
duradouro e nada tinha a ver comigo. Isso me deixou com certo alívio. Por outro
lado, Luíza demonstrava não apenas ser amável com Marie, ela estendia esse seu
modo a mim também. Aos poucos percebi que aquela mão na nuca fazendo um cafuné
nos meus cabelos era algo que exprimia isso da mesma forma que ela fazia o
mesmo com Marie. Mesmo tendo passado os dias anteriores em companhia de outras
mulheres, tanto da vizinha infiel como de Aline que naquela semana estava
arredia comigo, aquele jeito espontâneo e cativante de Luíza não era apenas um
indício da sua personalidade, mas também algo prezava em tantas outras como
Camila e Bianca que tinham os mesmos modos de expressar carinho e tornar as
coisas leves e com certo frescor. Seria pouco provável que cada uma delas
tivesse um repertório totalmente diferente umas das outras de como expressar
isso através de gestos e comportamentos. Por vezes, olhava para Luíza e via
nela os traços da beleza e fragilidade de Camila, assim como em outros momentos
conseguia pescar algum traço de gênio indomável de Regina e Elena, e até mesmo
a ambição presente na forma de ser de Aline davam sinais de estarem ali
escondidos em algum lugar. De Bianca ela tinha algo do jeito de falar e
caminhar exuberante e as mesmas palhaçadas que ela fazia.
Talvez encontrar um pouco de cada uma
misturado numa pessoa só fosse uma ilusão da minha percepção, e isso aliado ao
escasso tempo que passamos juntos, poderia ainda não ter me dado o tom peculiar
de como Luíza fosse realmente. Ela poderia ser uma soma de todas as outras ou
até mesmo a diferença desse cálculo imaginário que fazia na minha mente. A
melhor analogia que pude tecer para isso seria a de estar numa estrada nova,
mas com trechos da paisagem que eu já conhecia, e por lugares que eu já havia
passado antes. Entretanto, o final de semana em companhia delas foi alegre e me
esvaziou do estresse daquela semana repleta de reuniões nas quais definia os
novos rumos da empresa. Estar com uma filha e uma nova namorada no mesmo
apartamento que na maior parte do tempo servia apenas para dormir ou receber
amigos para jantares em algumas ocasiões, desta vez era diferente, o
apartamento ganhava ares de família de certa forma. As duas sentadas lado a lado num sofá
debatendo sobre roupas, sapatos, e fotos de viagem pareciam mãe e filha. Aquela cena me remetia ao pouco disso que
tinha vivido em outras ocasiões. Na maior parte desses momentos não estive
presente, apenas presenciei os bebês, e os vi crescer a distância. Acompanhei a
infância de cada filho via de regra em visitas e algumas férias juntos. Quando
me dei conta Quim e Marie já eram adolescentes e estavam as voltas com suas
mães e me procuravam para ajudá-los e isso trouxe eles morarem comigo e
conviverem comigo de forma direta e sem interferências do cotidiano ao lado das
mães castradoras. Primeiro Quim e depois Marie, cujas mães torciam o nariz e
faziam duras e pesadas críticas quanto a fato de estudarem no exterior, ambas
preferiam que primeiro cursassem faculdade aqui e depois mais maduros fossem
para tão longe delas. Como sempre
defendi a tese oposta que o quanto antes saíssem de casa para estudar e
aprender responsabilidades seria em mim que eles encontravam refúgio para se
abrirem e evitar que as vontades das mães fossem impostas de alguma forma.
Outro assunto que isso trazia para
minha pauta era a grande possibilidade de Ingrid ser minha filha. Tendo quase
certeza disso ao presenciar como ela é nos últimos meses em Curitiba, acreditei
que estava na hora de questionar Ágata sobre isso e caso ela confirmasse essa
hipótese teríamos que dizer isso para Ingrid numa hora propícia. Enquanto isso
não decorria, me considerava com certa sorte em ter uma boa relação com eles.
Não tinha passado tanto tempo com eles ao ponto de ter criado atritos e
desgastes; isso ficou a encargo das mães. Quando eles se aproximaram mais de
mim foi de algum modo uma iniciativa deles em recorrer ao pai distante que
endossava o que eles queriam. Sabia que
tinha que fazer isso com tato e ao invés de confrontar eles e dar razões para
tudo que as mães de cada um diziam e queriam, passei a dar para eles liberdade
de escolha em contraponto às responsabilidades que deveriam ter. Isso aos
poucos amarrou de vez o laço que tinha com eles e os fazia manterem uma
confiança recíproca que parecia que era algo que as mães tinham perdido nesse
momento.
Na semana seguinte tinha que visitar
o Quim e decidir provisoriamente qual faculdade ele deveria se focar para se
manter no EUA sem voltar para trás. Chegando lá pouca coisa precisava ser
resolvida nesses quesitos, ele mesmo por si só já tinha tudo bem definido os
rumos que a vida dele poderia tomar nesse sentido e bastaria aguardar os
períodos de admissão nos próximos meses. Aquele garoto atrevido e um pouco
rebelde que tinha passado algum tempo comigo tinha mudado, estava mais
compenetrado nas obrigações e contente por ter seguido o próprio caminho .
Quando retornei de lá seria a mãe de Marie a importunar ela com as mesmas
coisas que a mãe de Quim tinha feito sem sucesso algum tempo atrás. A história se repetia, e com algumas doses a
mais de brigas entre mãe e filhos. Regina tinha mudado o seu jeito de ser,
aparentemente aquela mulher desenvolta e segura tinha dado lugar a uma mulher
insegura e implicante, depois do casamento dela com um americano ela tinha
mudado drasticamente. Isso refletia diretamente no relacionamento dela com
Marie. Por sua vez, Marie parecia ter assumido as qualidades que a mãe havia
perdido. Isso parecia ser o ponto gerador de desentendimento entre elas em
diversos assuntos, em especial, o de estudar moda ou algo parecido no exterior.
Decorrente disso e do relacionamento que se esboçava com Luíza, Marie foi
ficando cada vez mais próxima não apenas de mim, mas por sinal de Luíza também.
Os dias se passaram quase sempre
seguindo a mesma rotina laboriosa de reuniões, discussões de projetos de
negócios e vez ou outra uma visita ao campo de golfe treinar umas tacadas.
Voltei para o Paraná e para aquela vizinha infiel, as vésperas de carnaval
aquele meu loft parecia um misto de escritório com papéis por todos os lados e
um esconderijo da vida pacata daquela vizinha adúltera. Apesar de ser uma
mulher fogosa e bonita, apesar do fato de não me incomodar com o perigo de
algum flagrante, eu já não estava disposto a servir a lascívia da vizinha
quando ela bem entendesse. Se ela tinha
algum problema com a falta de vigor do marido, com a calvície dele ou barriga
de chopp deveria abandoná-lo e recorrer aos jovens rapazes secos por uma
aventura com uma mulher mais velha e caliente como ela. Até pensei em dizer
isso para ela, mas não fiz isso, calei-me preferindo me submeter como amante
daquele adultério pelo simples fato dela ser boa de cama e sem tabus. Após mais
um encontro às escondidas como versa o manual das esposas infiéis resolvi
despistá-la e buscar prazeres no corpinho duma professorinha novata do colégio
da minha mãe. Essa era o oposto da vizinha infiel em temos de compromisso,
jovem e mãe solteira duma bela garotinha de dois anos, sua beleza despertava a
minha atenção, mas em termos de conversas e assuntos preferia a vizinha sem
dúvida. Já havia tempos que flertava com ela e até tinha dado um passeio com
ela, a coisa progrediu lentamente, até o ponto dela ser levada para cama. Mais
uma vez essa foi caso passageiro como a tal vizinha infiel, cerca de três
encontros madrugada afora já foram suficientes para me impor um certo
sentimento de culpa por estar traindo Luíza, visto que ela demonstrava cada vez
mais estar apaixonada por aquele canalha infiel pertinaz supostamente
incorrigível.
Talvez seja necessário perdoar alguns
canalhas, não todos, com base numa convicção de que o amor os inocenta. Como se
fosse uma teoria da culpabilidade que levam em conta os sentimentos do acusado.
Talvez também seja necessário definir esses homens como pessoas que
experimentam sentimentos e não os valorizam, mas quando passam a valorizá-los
as coisas mudam de ponta cabeça em suas vidas.
Quando isso acontece os dilemas entre levar uma vida sempre na mesma
tônica, dos amores fáceis, das conquistas fugazes e do trato inconsequente
sobre tudo isso passa a criar atrito com sentimentos puros que surgem em nós à
nossa revelia e muitas vezes nos confundem. Muitos desses homens ficam
comovidos com esses sentimentos puros e até mudam, mas um dia inevitavelmente
essa sensação se torna opaca e eles se tornam mais uma vez indiferentes ao
valor desses sentimentos.
Essa idéia só se tornou clara na minha
mente depois de mais um caso passageiro com uma advogada casada, a quem
conhecia de longa data e sempre havia entre nós flertes, e algumas
oportunidades de levar a cabo nossas segundas intenções, porém nunca nada disso
foi levado a sério. Dessa vez o jogo mudaria, ela estava se mudando para
Curitiba e me telefonou, contou que estava procurando uma casa para morar na
cidade e que tinha vindo sozinha e o marido estava quilômetros de distancia em
outro lugar. Foram apenas três dias em
companhia daquela bela ruiva, bastou um encontro num almoço, uma mão sobre a
outra na mesa, um beijo na boca, e tudo desenrolou. Mais uma vez uma ponta de
culpa surgiu assim que táxi dela virou a esquina. Era apenas mais uma como
tantas outras indo embora; seguindo sua vida e me deixando para trás.
Naquele momento fui dar uma volta
caminhando, fumando lentamente um cigarro após o outro. Recordava de cada
momento passado na presença de Luíza e achava que tudo aquilo seria no mínimo
injusto com ela que estava sendo tão sincera comigo quanto aos seus
sentimentos. Ela já tinha me apresentado aos pais, aos avós, aos irmãos e
amigos, enfim tinha me colocado em contato com a vida dela como se esperasse
algo sério entre nós. Da minha parte aquilo não passou apenas de momentos de aborrecimentos,
ter que conhecer o pai dela, um quarentão caretão, que se casou cedo e parecia
não ter aproveitado nada da vida de solteiro. Aquele sujeito metódico, recheado
de opiniões prontas sobre qualquer assunto era no mínimo entediante. A mãe uma
ex-alcoólatra que tinha posto o casamento e vida familiar em xeque mate no
tempo que Luíza era adolescente ao menos tinha certa simpatia que é comum nos
ébrios. O irmão pirralho não passava duma criança mimadas pelo pai, e Luíza
parecia destoar de tudo aquilo como se fosse uma alma independente no meio
daquelas pessoas aparentemente satisfeitas com suas vidas dentro da média. Luíza tinha contrariado as intenções do pai
que queria que ela fosse médica como quase todos da família, ou ao menos que
fosse herdeira dos pacientes dele. Saiu de casa, pagou a própria faculdade
sozinha, optando pelas ciências jurídicas para o desgosto do pai controlador. Viveu
a vida dela o máximo que pode longe das interferências do pai. Mesmo assim era
nítido que ele não tinha desistindo em insistir em certas coisas e desaprovava
desde o namorado anterior, como qualquer outro pretendente da filha. Comigo não
pareceu diferente, fez o habitual interrogatório dos pais mandões que faria
qualquer moleque tremer principalmente por não ter um emprego decente para os
padrões dele. Dessa vez ele tinha quebrado a cara. Encontrou pela frente,
modéstia a parte, um sujeito com a vida estabilizada, que não devia nada para
ninguém e que pouco estava se lixando para opinião dum médico provinciano cheio
de manias.
Toda aquela empáfia do pai de Luíza
batia no meu desdém pela opinião dele sobre mim e de certa forma isso fez
surgir na filha certo sentimento de segurança que nenhum outro rapaz desavisado
tivera causado nela. Nova Friburgo tinha ficado pequena demais para o ego do
pai e do namorado da filha. Passamos o dia seguinte a sós num hotel fazenda,
num clima romântico, enquanto isso o pai da moça que ficasse atônito com suas
frescuras habituais. Aproveitei a sensação de segurança de Luíza e passei a provocá-la
para ver se algo mais aconteceria entre nós naquele hotel fazenda com paisagem
de montanhas e muito verde. Foi nessa ocasião, que ela revelou algo que eu
temia ser verdade devido o comportamento comedido e restritivo dela em certas
ocasiões. Meio sem jeito e ruborizada revelou que ainda era virgem e aquilo me
deixou perplexo por alguns minutos, mas por outro lado atiçou minha imaginação
erótica como se fosse um garoto de doze anos na mesma situação. Essa novidade
me fez inevitavelmente recordar de Aline que apesar de virgem era uma garota
atrevida e sensual, logo que me divorciei de Bianca não tive dúvidas em
iniciá-la na arte do prazer, e mais ou menos um ano depois ela não devia nada
nem mesmo para aquela vizinha fogosa e infiel com anos de praia que tinha tido
mil namorados e talvez uma dúzia de amantes na sua coleção de infidelidades.
Fiquei pensando tanto em Aline que
quando voltei mesmo ela estando arredia comigo devido saber do meu romance com
Luíza passei a agradá-la até que ela cedeu aos meus avanços numa viagem de
negócios e passamos a noite juntos. Após
esses dias cheios de aventuras voltei para Curitiba inaugurar o novo escritório
da filial da empresa. Depois de mais ou menos dois anos de preparativos tudo
estava maduro para expandir e abrir uma sede na região. Nessa ocasião estando
preso ali por conta das obrigações profissionais resolvi conversar com Ágata
sobre Ingrid. Cheguei na casa dela e apenas ela ainda estava acordada, ela me
ofereceu um chá e perguntou qual era o assunto que me trazia ali como se já
tivesse previsto que aquele dia iria chegar. Logo que anunciei o tema da
conversa ela levantou da cadeira da cozinha como se tivesse um estalo de
nervosismo e olhando séria no meu rosto disse: Sabe quanto tempo eu tenho
esperado você tocar nesse assunto? Anos! Achei que você nunca iria perceber
algo tão óbvio, pensei que faria de conta que não era da sua conta, como fez
todos esses anos! – Tentei interrompê-la e dizer algo; mas ela prosseguiu: Eu
sempre quis te falar sobre isso, mas nunca tive coragem também, acho que fui
tão covarde quanto você e todos os dias ficava aflita em saber que um dia eu
teria que contar isso para Ingrid mesmo que você não desse a mínima para isso!
Ainda bem que você pelo jeito vai nos poupar desse desgosto e pelo visto está
interessado nisso dum jeito que nem eu, nem a sua mãe cogitávamos que fosse
acontecer! Depois de proferido um longo discurso de desabafo Ágata finalmente
ouviu cada coisa que eu tinha a dizer sobre este assunto e pereceu aliviada por
ter chegado o dia da verdade. Mesmo assim fez me prometer que só contaríamos
isso para Ingrid depois do baile de debutante dela que seria nas próximas
semanas. Aquela conversa franca, aberta e sem rodeios tinha me dado a sensação
de que tinha acertado as contas com o passado e presente, parecia que um senso
de justiça tinha iluminado a minha razão e isso passou a invocar dentro de mim
mais questões. Dessa vez essas questões estavam ligadas com Aline e Luíza, algo
me dizia que teria que escolher entre uma ou outra, ou nenhuma delas para que
eu pudesse ficar em paz comigo mesmo.
Foi pensando nisso que tomei todos os
fatos dos últimos meses numa espécie de retrospectiva impiedosa e fria, e
analisei cada coisa que tinha feito, achei que estava viciado em canalhices,
futilidades e infidelidades e alguma coisa deveria mudar para viver algo mais
profundo e concreto. Passei a fazer cálculos numa espécie de matemática
existencial, conversando com uma pessoa ou outra a quem podia confidenciar tais
coisas escutava inesperadamente probabilidades diversas para tudo que pensava e
sentia. Numa álgebra que calculava amar alguém mais e outro alguém menos, aos
poucos fui deduzindo que não era essa a questão crucial. Na verdade não fazia
sequer sentido pensar as coisas dessa forma, pois calcular sentimentos e ações
com exatidão matemática é algo impossível, mesmo que fosse possível seria uma
violação da honestidade sobre tais sentimentos. Alguma coisa nisso tudo me
remetia aos romances russos de Dostoievski ou Tolstoi, e me faziam pensar que
se algum dia na vida eu encontrasse alguma Nastassia Philoppovna ou Anna
Karenina isso seria suficiente para resolver esses impasses duma forma mais
amena.
Ao passo que divagava sobre essas
coisas, entre uma noite e outra, achava que todas as mulheres que havia
conhecido eram sínteses de Maria Madalenas com Marias ou de Terezas com
Sabinas. Não havia um parâmetro adequado para saber o quanto uma era diferente
da outra, no final das contas desses cálculos insólitos cheguei conclusão que
talvez tivesse conhecido todas superficialmente e de que não tinha amado
nenhuma delas realmente. Pior ainda seria não ter solução para isso e ser capaz
de amar ao menos uma por inteiro sem os velhos hábitos e condicionamentos
egoístas e do orgulho que privam as pessoas de conhecer a realidade sobre si
mesmas. Chegava a crer que uma certa forma de insanidade empurrava homens como
eu para o casamento e uma forma de racionalidade me levava aos contínuos rabos
de saia. Depois invertia os termos e a racionalidade e insanidade não faziam
sentido nessa conjectura, com isso passava achar que fé e esperança nas pessoas
eram as virtudes para essas coisas acontecerem. No fundo tudo isso não passou
dum emaranhado filosófico sem sentido, numa tentativa de refutar as razões
pelas quais uma amiga psicóloga disse que tinha medo de relacionamentos mais
sérios. Ao menos aquela sensação do desfecho de Fellini 8 e ½ parecia fazer
mais sentido que tudo isso.
Foi durante o baile de debutante de
Ingrid que comecei a notar que estava com todas essas questões em aberto na
minha cabeça como se estivesse numa encruzilhada. Durante a festa, com toda
aquela pompa e circunstância que notei que tinha algo fora do padrão habitual.
Ao ver Luíza naquele vestido longo, de ombros de fora, com sorriso largo
irradiando simpatia desenvoltura num ambiente no qual ela conhecia poucas
pessoas que percebei que em tão pouco tempo não era apenas a beleza dela que me
atraia, mas também o jeito de ser dela. Passei o baile inteiro alheio ao cerimonial
que de certa forma era apenas mais um sonho de adolescente sendo realizado em
grande estilo. Fiquei prestando a atenção em cada gesto e momento de Luíza, no
modo que ela conseguia atrair os olhares de outros homens e também das mulheres
com seus falsos ares de aristocracia adquiridos em shoppings centers.
Antes disso, eu apenas estava
extasiado com a beleza dela, do jeito dela parecer com tantas outras que haviam
passado na minha vida, estava motivado pelo fato dela ser inexperiente e que
tudo que poderia proporcionar para ela seria algo novo. De um lado os violinos
tocavam seus acordes com sinos ao fundo, mas o lado racional e egoísta dava
marretadas nesse sentimento de paixonite tão pueril. Algo me dizia que para ficar ao lado dela
teria que renunciar todas as outras, dentre elas havia Aline, a qual era de
certa forma a rainha desse baralho com mulheres de tantos naipes. Mesmo assim
me concentrei nos encantos da bela carioca e a chamei para dançar, passei a mão
pelo ombro dela, pelas costas sorrateiramente, deslizei pelo braço e cotovelos
como se estivesse acariciando uma seda, segurei a mão dela e a levei para a
pista de dança. De novo experimentei aquela sensação de ser o garoto com a
menina mais bonita da escola, todos olhavam atentos o casal e até mesmo a velha
francesa olhava com aprovação a nova conquista do filho. Entre um passo e
outro, só tinha olhos para os olhos de Luíza, e ela que antes ficava um pouco
constrangida com esses pequenos gestos de sedução, naquele dia estava
inteiramente inebriante e segura. Quase no final do baile reconheci os acordes
de Moonglow, algo tão inesperado quanto essa música, foi a reação que tive de
sair de cena da vista de todos e levá-la num recanto a sós para namorar com a
música ao fundo. A noite estava perfeita,
mas mesmo assim, com toda essa magia e empolgação de tantos beijos apaixonados
Luíza quase não resistia em ceder ao momento, porém, não foi dessa vez que ela
iria se entregar.
Talvez tenha sido essa negativa
naquela noite tão cheia de emoções que me fez ir para os braços de Aline tão
logo a revi em São Paulo. Por outro lado, talvez também tenha sido tudo que
ocorreu de bom naquela noite que me fez decidir a deixá-la também. Depois de
noites e noites às escondidas com Aline, saindo e voltando para o apartamento
sem que Marie desconfiasse das fugas noturnas do pai, resolvi terminar tudo com
Aline no dia da conjunção de marte com a lua. Naqueles dias a minha cabeça
estava a mil, com assuntos do escritório, com a fuga repentina de Marie para
São Paulo depois duma série de brigas com a mãe, aliado a isso cada final de
semana passado com Luíza me fazia acreditar que me aproximava do dia que logo
ela cederia a tantas investidas românticas da minha parte para um gran-finale
na cama. Outro elemento que me levava a deixar Aline eram suas constantes
pequenas crises de ciúmes em virtude da atenção que eu estava dando para Luíza.
Parecia que dessa vez ela se importava em ser a outra, que aquele posto já não
seria mais aceito por ela até mesmo ao ponto dela resolver entregar o nosso
relacionamento para Luíza num desses arroubos intempestivos de ciúmes. Dessa
vez, Aline que sempre manteve-se segura de que ela, apesar de qualquer outra
era a única para quem eu sempre voltava, parecia apostar nisso, mas não com tanta
segurança como das outras vezes. Ela
passou a repetir isso constantemente também, assim como, cada vez que
repetia que seria para ela para quem eu retornaria depois de me frustrar com
Luíza devido julgar ela uma garota mimada e pedante, passou a deixar claro que
poderia fazer algo para que o meu romance com Luíza fosse água abaixo.
Ao ponto que isso passou a incomodar
e devido a possibilidade das bravatas dela se tornarem reais as coisas entre
Aline e eu foram perdendo o sentido e esfriando da minha parte. Aline estava
perdendo o encanto para mim, e tudo que ainda me atraia nela estava ficando em
segundo plano devido aos ataques de ciúmes e ameaças dela. Terminei com ela, e
mesmo achando que isso iria me tirar um peso da consciência, no fundo me deu
certa tristeza, pois de alguma forma ainda sentia algo por ela, algo que só
percebi logo depois que já tinha jogado todas cartas na mesa para findar nossa
relação de amantes. No final de semana seguinte estava com Luíza mais um vez, e
mesmo estando com ela e tudo correndo bem entre nós, num momento ou outro
surgia uma espécie de arrependimento por ter libertado Aline daquela condição
de eterna amante. Nesse mesmo final de semana, por ironia do destino, Luíza
resolveu ter a sua primeira crise de ciúmes também e armar barraco. Ao
apresentar uma prima estudante de medicina, a qual achei cuspida e escarrada
como Ágata na época que a conheci, Luíza logo ficou insatisfeita com a atenção
que dispensei a tal prima em decorrência desse fato inusitado. Ela brigava,
enquanto ficava calado, aos poucos consegui contornar mais uma crise de ciúmes
feminina através de velhas estratégias e logo estávamos novamente aos beijos e
abraços como se nada tivesse acontecido. Após isso, como estava com a agenda
mais livre, passei mais alguns dias no Rio como se fossemos um casal de recém
casados naquele novo apartamento que Luíza tinha acabo de comprar. Planejamos
viajar para Argentina à convite de Paolo, e numa noite depois dum jantar
desprentensioso Luíza foi dormir cedo como habitual, fiquei terminando alguns
preparativos para negócios que teria que resolver na próxima semana noite a
dentro.
Após algumas horas de silêncio
trabalhando resolvo fazer um happy hour solitário antes de dormir. Pego uma
garrafa de vinho, encho a taça, me sento numa cadeira na varando e fico
apreciando a cidade dormindo. Penso em Aline com uma ponta de saudade
incomodando devido decisão tomada dias atrás. De repente surge na porta da
sacada Luíza de pijama coçando os olhos e bocejando depois de ter feito um abajur
cair no chão da sala. Ela me questiona se não vou dormir, reclama do frio
daquela noite, puxo ela pela mão coloco ela no colo, ajeito seus cabelos loiros
escuros e ela fica ali alguns minutos quieta até que me pede um beijo de boa
noite mais uma vez alegando frio. O que era para ser mais uma breve beijoca de
boa noite se transforma num beijo longo, carrego ela até o quarto dela, e a
deito na cama, finalizo o beijo longo e dou boa noite. Dessa vez ela não quer
boa noite e pede mais beijos, e assim entre um beijo e outro, o frio daquela
noite logo é esquecido por ela, e aos poucos cada peça daquele pijama deixa o
corpo dela rumo ao chão do quarto, e da boca o beijo passa a ser no pescoço,
nos ombros nos seios, na barriga e coxa dela, até finalmente aquela meias ser a
única peça de roupa que resta, e que tiro lentamente olhando para ela que olha
para mim dócil como uma gata manhosa. Tiro a camiseta coloco o pé dela no meu
peito e acaricio sua perna e pé e ela me pede outro beijo. Faço o caminho de
volta pelos pé, joelho coxas dela até os quadris, sentindo o calor dela coloco
a mão na parte de trás da cintura deslizando pelas costas até o pescoço, a
seguro nos meus braços, a beijo até começar a fazer amor lentamente; sem mais
pensar em nada apenas escuto cada gemido de Luíza que se entrega pela primeira
vez.
Pela manhã o despertador berra nos
nossos ouvidos, Luíza acorda assustada, e fica olhando para o seu pijama jogado
no chão com a mão no queixo, depois olha para mim e ao invés de dizer bom dia
se lança sobre mim, sem mais nenhum pudor e diz baixinho no meu ouvido: Você
sabia que isso iria acontecer não é mocinho? Respondi que sabia, mas não sabia
quando, e ela cola sua testa e nariz no meu rosto olho no olho me diz lábios
nos lábios: Então saiba que só fiz isso porque te amo! Depois disso um beijo e
quase que ela perde a hora de ir para o trabalho.
Nenhum comentário:
Postar um comentário